terça-feira, fevereiro 26, 2008

Oscar 2008 - enterro dos ossos


Pai Gustavo Prevê o Futuro
Das oito principais categorias da noite de domingo, dei antecipadamente o nome de cinco vencedores, como vocês podem ver no post abaixo. Além disso, nas outras três categorias, reduzi o número de potenciais ganhadores para dois – no caso de melhor atriz, que mencionei que ficaria entre Julie Christie e Marion Cotillard, e no caso de roteiro adaptado, em que disse que ficaria entre os Coen e Paul Thomas Anderson – ou três – no caso de atriz coadjuvante, em que citei Cate Blanchett, Tilda Swinton e Ruby Dee. Nos três casos, os vencedores estavam dentre os nomes citados.
Acho que vou armar uma tenda e começar a prever a sorte, desfazer amarração, mau-olhado, trazer a pessoa amada de volta em cinco dias úteis – não trabalho fim de semana. Pedidos e cartas poderão ser enviados para o endereço do site.
E, por via das dúvidas, vou jogar na mega-sena amanhã. De repente...

A cerimônia – rapidinhas

Daniel, Tilda, Marion e Javier
É sempre legal ver bons ou, como foi o caso, excelentes atores serem premiados no Oscar. Nem sempre isso ocorre. Nunca se esqueçam de Julia Roberts em 2001, por Erin Brockovich, de Cuba Gooding Jr. em 1997 por Jerry Maguire, ou da Cher em 1988, por Feitiço da Lua (ganhando simplesmente de Glen Close, por Atração Fatal, e Meryl Streep, por Ironweed).

Prestem atenção: Marion Cottilard vai bombar de novo nas telas em... 2009. Pois é, vai demorar um pouco. Ela estará no novo filme de Michael Mann, Public Enemies, ainda em pré-produção. Com Johnny Depp e Christian Bale.

Jon Stewart me perdoe, mas: Socorro!!! Tragam Billy Cristal de volta, urgente!!!! Que cerimônia mais chocha. Falta mais piada infame. Falta mais animação. Falta Billy.

Dentre as mulheres mais lindas da noite, duas grávidas: Cate Blanchett e Jessica Alba. Pelo jeito, é o único jeito de evitar uma epidemia de anorexia em Hoollywood: baby boom.

Se a festa não era a fantasia, por que Daniel Day-Lewis foi de pirata – com um paletó do século XVIII e uma argola de ouro pendurada em cada orelha – e Tilda Swinton de assombração?

Se George Clooney continuar a enrugar e encolher do jeito que está, em pouco tempo vai ficar a cara do Martin Landau. Repara só.

Jon Stewart volta dos bastidores morrendo de rir dizendo que os vencedores da categoria canção original, Glen Hansard e Markéta Irglová, estavam brincando com as estatuetas nos bastidores, fazendo elas se beijarem na boca. De repente Markéta diz, ei, mas os dois são homens. No que Glen responde, não tem problema, estamos em Hollywood. Meia hora depois, quando o Oscar de melhor ator é anunciado, Daniel Day Lewis, antes de subir no palco, dá uma bitoca em... George Clooney. Clooney? Pois é, Glen, Hollywood.

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domingo, fevereiro 24, 2008

Oscar 2008 - parte quatro

Apostas para hoje à noite
Melhor filme:
Não há muita dúvida. Juno é uma gracinha; Atonement é um drama de primeira; Micheal Clayton um thriller de advogados como há muito não se via. E There Will ber Blood, bom, como já disse, é o melhor filme de 2007. Uma seleção boa, como há muito não se via. Mas o homenzinho dourado, hoje, deverá ir para No Country for Old Men, dos Coen. Por quê? Oscar não é matemática, mas, vejamos. Os votantes da Academia são, em sua maioria, atores. Além deles, também votam diretores, produtores e roteiristas. Pois o filme dos irmãos Coen ganhou simplesmente os principais prêmios dos quatro sindicatos em questão: O Screen Actors Guild, o Directors Guild of America, o Producers Guild of America e o Writers Guild of America.
Acredito que uma surpresa, e a única possível nessa categoria, seria o Oscar de melhor filme ir para There will be Blood. Mas o mais provável é que os irmãos Coen saiam com o principal prêmio debaixo do braço.

Melhor Diretor:
Mais uma vez, os Irmaõs Coen, o monstro cinematográfico de duas cabeças, devem ganhar. Mas a Academia também gosta de pregar pequenas surpresas. Com o Oscar de melhor filme garantido para os Coen, não é de se surpreender que outros diretores aumentem as chances de ganhar. Nesse caso, mais uma vez, o anti-épico There Will be Blood, e seu diretor, Paul Thomas Anderson, são minhas apostas. Além disso, Reitman, diretor de Juno, é muito novo. Gilroy, Michael Clayton, é estreante, e Schnabel, de Le Scaphandre et le Papillon, muito alternativo.
Melhor Ator:
Esse é a única categoria, em toda a noite, em que não haverá nenhuma surpresa. Repito, aposto todos os meus dobrões que não haverá surpresa aqui. Hoje será a noite de Daniel Day-Lewis sair consagrado do Kodak Theater. Será seu segundo Oscar – ganhou seu primeiro por Meu Pé Esquerdo, em 1990. Até George Clooney, um dos candidatos, disse, em recente entrevista para a Time Magazine: “Sou a Hillary Clinton do Oscar. Eu até teria chance de vencer, se Obama não estivesse concorrendo”. Obama, nesse caso, é Daniel Day-Lewis.

Melhor Atriz:
A Academia gosta de render homenagens. Premiar um ator em fim de carreira. Foi assim com Michael Caine, Jessica Tandy, e por aí vai. Esse ano, podem fazer isso de novo, dessa vez com Julie Christie. Afinal, quem não gosta de Julie Christie? Nossa eterna Lara de Doutor Jivago, Julie teve uma carreira de sucesso, principalmente nos anos 60 e 70. Após anos fazendo pequenos papéis, Julie está excelente em um filme nem tanto, Away from Her.
Há uma pedra no caminho de Julie. Essa pedra é francesa. Marion Cotillard é responsável pela melhor performance feminina no ano de 2007. Sua personificação de Edith Piaf em La Mome é sobrenatural. Assustadora. Comovente. Se a premiação da Academia fosse justa, não haveria dúvidas, Cotillard ganharia. Mas não é. Torço por ela, mas temo que Marion perca a estatueta para o coração mole da Academia, que gosta de passar a mão na cabeça dos seus favoritos, como é o caso de Julie.

Melhor Ator Coadjuvante:
Poderíamos adaptar a frase de Clooney aqui. Se Barden não estivesse concorrendo, seria uma categoria equilibrada. Casey Afleck, por exemplo, leva seu filme nas costas, em uma atuação perfeita, conseguindo mesclar melancolia e tensão. Philip Seymour Hoffman é um dos melhores atores de sua geração, e será indicado ainda muitas vezes nos próximos anos. Tom Wilkinson é o ator com quem todo mundo gostaria de contracenar, e George Clooney viu isso. Está fantástico, em um filme mediano – por sinal, os coadjuvantes de Michael Clayton dão um show, Wilkinson e Tilda Swinton. Mas, não, esqueçam: os Oscar irá para o novo queridinho latino da Academia. Javier Barden. Será ele um Banderas que sabe atuar, perguntava-se a Academia. Barden mostrou pra todos que não só sabe: é excepcional.

Melhor Atriz Coadjuvante:
Uma das categorias mais disputada da noite. Todos querem que Cate Blanchett leve seu segundo Oscar. Mas Tilda Swinton está espetacular em Michael Clayton. E, correndo por fora, Ruby Dee tem aumentado suas chances, principalmente depois que faturou o Screen Actors Guild deste ano. Além disso, há sempre o fator idade: Ruby tem 84 anos. Será ela a Jessica Tandy da vez? Bom, hoje a noite torço por Cate.

Melhor Roteiro Original:
Mais um Oscar com pouca disputa. Diablo Cody, roteirista de Juno, leva fácil. Será interessante vê-la subir no palco. Por quê? Bom, procurem saber mais sobre essa menina, e vocês entenderão.

Melhor Roteiro Adaptado
Difícil categoria, disputada. Mais uma categoria em que haverá o embate direto entre os irmãos Coen e Paul Thomas Anderson. Tudo dependerá de quão Coen será a noite.

Façam agora vocês suas apostas. E boa diversão hoje à noite.

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sábado, fevereiro 23, 2008

Oscar 2008 - parte três

Os vencedores desde já

Antes que os envelopes sejam abertos e discursos chorosos comecem a ser desfiados. Antes que Jon Stewart faça as prováveis piadas sobre a greve dos roteiristas e as primárias americanas. Antes que o show comece, já podemos contabilizar alguns vencedores. Vejam:
Irmãos Coen

Essa entidade de duas cabeças e muitos filmes no currículo finalmente pode ser considerada, hoje, o grande nome do cinema mundial, junto com Almodovar. Joel e Ethan colecionam prêmios e filmes excelentes em uma carreira de quase vinte e cinco anos. Já ganharam Sundance - com seu primeiro filme, Blood Simple -, já ganharam Cannes, algumas vezes por sinal. Já ganharam Oscar de melhor roteiro original, por Fargo. Falta agora o grande prêmio, seja ele o de direção ou de filme - o que deverá acontecer amanhã. Aposto no de direção. De qualquer forma, é o segundo filme deles com uma imensidade de indicações, oito, ultrapassando o último grande sucesso deles, Fargo, que recebeu sete e levou duas - roteiro adaptado e atriz. Enfim, Joel e Ethan são, hoje, os novos irmãos Lumiere, os irmãos Cinema.

Paul Thomas Anderson
Já havia feito dois ótimos filmes, Boogie Nights e Magnólia, uma ótima comédia, Punch Drunk Love. Agora, com apenas 37 anos, mostrou para todos que já é gente grande. Que quer mais. There will be blood é o melhor filme do ano de 2007, sem dúvida. Não deve ganhar melhor direção porque os Coen devem levá-la pra casa. Mas provavelmente levará melhor filme - nesse caso, levar mesmo, porque participou da produção do filme. E ainda corre o sério risco de levar roteiro adaptado - também escreveu o roteiro do filme. O garoto é bom.

Tony Gilroy
Já era respeitado em Hollywood como roteirista. Escreveu a trilogia Bourne, o roteiro de the Devil's Advocate - bom filme com Pacino e Keanu Reeves. No primeiro filme que dirige, Michael Clayton, recebe indicação a melhor diretor. Michael Clayton está indicado em sete categorias. The Bourne Ultimatum, em que foi roteirista, outras três. Nada mal, participar de dois filmes que, juntos, somam dez indicações.

Cate Blanchett
Nos últimos quatro anos, um Oscar na prateleira e outras três indicações. Oscar de atriz coadjuvante em 2005, por the Aviator. Indicação em 2007, por Notes on a Scandal. E duas, sim, duas indicações esse ano: melhor atriz por Elizabeth, the Golden Age, e melhor atriz coadjuvante por I'm not there. Não deverá ganhar melhor atriz, mas tem chances reais de levar pra casa um segundo Oscar de atriz coadjuvante - se Tilda Swinton deixar. Cate já merece uma estrela na calçada da fama.

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sexta-feira, fevereiro 22, 2008

Oscar 2008 - parte dois

Barrados no Baile, ou, Esqueceram de Mim

Antes de falar dos indicados, vale a pena falar dos que não foram convidados pra festa. Dos esquecidos. Dos injustiçados.
Todo ano é a mesma coisa, como todo prêmio, há opiniões divergentes, discussões, indignações sobre quem venceu, quem deveria ter vencido. Mas nem sempre se fala dos que nem chegaram nos play-offs, nas finais. Esses, coitados, são sumariamente esquecidos.
Alguns filmes e atores que conquistaram crítica e público (às vezes um ou outro) não foram lembrados para o Oscar. Vejamos.

Zodicac
Não esperava uma dezena de indicações, mas, céus, quando esse filme saiu nos EUA, os críticos chegaram a ser chatos por tão unânimes. Todos o aprovaram. Não seria surpresa nenhuma ver seu nome lembrado em roteiro adaptado ou ator coadjuvante (no caso, robert Downey Jr.). Pois é, nada disso. Direto para o esquecimento.

Goya's Ghosts
Milos Forman estava há anos fora de circulação. Volta com um bom filme, diria muito bom. A Academia gosta dele, gosta dos seus filmes. Mas dessa vez o ignoraram solenemente. Nada. Nem para diretor, nem para as categorias menores, figurino, fotografia, algo assim. Naaa. Direto para o oblívio.

Hairspray
Uma das melhores comédias do ano passado. Indicado a três Globos de Ouro. Zero no Oscar.

Os Simpsons
A Academia não gosta de filmes politicamente incorretos. Bart bêbado, policias gays, acho que foi demais. Preferiram indicar o bobinho Surf's Up (Tá dando onda) para melhor longa de animação.

Charlie Wilson's War
Outro filme muito bem cotado pela crítica. E... esquecido. Ok, quase esquecido. Phillip Seymour Hoffman foi indicado a ator coadjuvante. Mas Hoffman está num ponto de sua carreira que, se fizer uma ponta num filme dos irmãos Farrelly (Quanto mais idiota melhor, Quem quer ficar com Mary), é indicado ao Oscar e, bobear, ganha. O rapaz está impossível.

Meninas que não foram convidadas para o baile:
Meryl Streep, por Lambs for Lions. Meryl Streep deveria ser indicada por qualquer coisa, até anúncio de margarina. E olha que eu não gosto dela.
Keira Knightley, por Atonement. Sua atuação não é excelente, mas, ei, Julia Roberts já ganhou um Oscar e foi indicada outras duas vezes.
Helena Bonhan Carter, por Sweeney Todd. Já merece um Oscar há tempos. Está sempre bem, qualquer que seja o filme. Mas esqueceram dela. De novo.
Keri Russel , por Waitress. A eterna Felicity do seriado de mesmo nome conseguiu vencer a má vontade da crítica e ganhou o respeito de todos com esse filme. Menos da Academia.
Amy Adams , por Enchanted. Eu sei, eu sei. Filme da Disney. Comédia. Mas muita gente esperava que ela conseguisse ao menos uma indicação. Ou por Charlie Wilson's War, em que tem um papel menor. Não. Nenhum dos dois.

There will be blood
Não, não me enganei. O filme foi indicado em oito categorias. Sim, mas esqueceram uma. Trilha sonora, feita por Jonny Greenwood, do Radiohead. É maravilhosamente incômoda, desagradável. Consegue nos inserir perfeitamente no mundo distorcido e imoral de Daniel Plainview. Pelo jeito, a Acamedia não gostou.
Se lembrarem de mais esquecidos, comentem.

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Oscar 2008 - parte um



Muita gente não tem idéia do que sejam os Academy Awards. Já aquela cerimônia que tomou emprestado o nome do troféu, um homenzinho dourado e careca, todos conhecem: Oscar. Pois é, o apelido pegou.

Na minha casa, não se perde Oscar. Pode-se perder eleições, primárias americanas, apuração das escolas do grupo especial, Páscoa, Ramadã ou especial de fim de ano do Roberto Carlos. Com Oscar não se brinca. Nem se negocia.

Assisti à premiação pela primeira vez em 1986, quando Out of Africa (Entre Dois Amores) foi o grande vencedor (Filme, Diretor, Roteiro Adaptado, e mais uns outros quatro de lambuja). Curiosamente, ganhamos um Oscar naquela noite. Sim, William Hurt ganhou melhor ator com O Beijo da Mulher Aranha. E ninguém vai me convencer que esse filme não é brasileiro: Babenco é o argentino mais brasileiro do mundo do cinema, e o filme tem a Sonia Braga. Repito, Sonia Braga. Não preciso de mais nenhum argumento: ganhamos um Oscar em 1986.

Desde então, venho acompanhando a cerimônia religiosamente. Lembro de quando o dramático "and the winner is" foi substituído pelo politicamente correto "and the Oscar goes to". Foi em 1989. Ano em que o papa-Oscar foi Rain Man, não por acaso um filme bem politicamente correto.

Sou da geração Billy Cristal. Sinto saudades dele. Billy apresentou o Oscar de 1990 a 1993, sem largar o osso, e depois em 1997, 1998, 2000 e 2004. Pra quem não lembra, ou nunca assistiu, Billy começava sempre a cerimônia cantando uma música, um pout pourri de melodias e letras bem humoradas e às vezes escrachadamente engraçadas que remetiam aos candidatos a melhor filme do ano. Não esqueço o ano em que um dos candidatos era The Crying Game (Traídos pelo Desejo), e Billy, a cada trinta segundos, se referia ao filme segurando as partes - quem já viu o filme, entendeu a piada, quem não viu, veja, é excelente, um drama de primeira. Pra mim, mestre de cerimônias do Oscar é o Billy Cristal, assim como o papa é e sempre será o Jõao Paulo II.

Esse ano, octagésima cerimônia, uma seleção surpreendentemente boa. Nenhum filme genial, que ficará para a história do cinema, mas muita coisa boa. Segue abaixo as indicações para as principais categorias. No próximo post eu falo sobre cada um dos indicados.


MELHOR FILME:
Atonement
Juno
Michael Clayton
No Country for Old Men
There Will Be Blood

MELHOR DIREÇÃO:

Paul Thomas Anderson, por There Will Be Blood
Ethan Coen, Joel Coen, por No Country for Old Men
Tony Gilroy, por for Michael Clayton
Jason Reitman, por Juno
Julian Schnabel, por Le Scaphandre et le papillon

MELHOR ATRIZ:

Cate Blanchett, por Elizabeth: The Golden Age
Julie Christie, por Away from Her
Marion Cotillard, por Môme, La
Laura Linney, por The Savages
Ellen Page, por Juno

MELHOR ATOR:

George Clooney, por Michael Clayton
Daniel Day-Lewis, por There Will Be Blood
Johnny Depp, por Sweeney Todd: The Demon Barber of Fleet Street
Tommy Lee Jones, por In the Valley of Elah
Viggo Mortensen, por Eastern Promises

MELHOR ATRIZ COADJUVANTE:

Cate Blanchett, por I'm Not There
Ruby Dee, por American Gangster
Saoirse Ronan, por Atonement
Amy Ryan, por Gone Baby Gone
Tilda Swinton, por Michael Clayton

MELHOR ATOR COADJUVANTE:

Casey Affleck, por The Assassination of Jesse James by the Coward Robert Ford
Javier Bardem, por No Country for Old Men
Philip Seymour Hoffman, por Charlie Wilson's War
Hal Holbrook, por Into the Wild
Tom Wilkinson, por Michael Clayton

MELHOR ROTEIRO ORIGINAL:

Juno: Diablo Cody
Lars and the Real Girl: Nancy Oliver
Michael Clayton: Tony Gilroy
Ratatouille: Brad Bird, Jan Pinkava, Jim Capobianco
The Savages: Tamara Jenkins

MELHOR ROTEIRO ADAPTADO:

Atonement: Christopher Hampton
Away from Her: Sarah Polley
Le Scaphandre et le papillon: Ronald Harwood
No Country for Old Men: Joel Coen, Ethan Coen
There Will Be Blood: Paul Thomas Anderson

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quinta-feira, fevereiro 14, 2008

todos os eus e mais alguns - parte XII (ainda)

(continuando o post anterior...)

Com um amigo, num café (não, dessa vez não é o inagaki).

– E o que ela disse?
– Nossa...
– ...
– ...
– ...
– ...
– Então, o que ela disse?
– "Nossa". Ela disse isso. “Nossa”.
– Ah...
– Pois é.
– Humm... só?
– Só. Ela me auscultou e...
– O quê?
– Auscultou, escutou com o coisinha...
– Eu sei o que é “auscultar”.
– Pois ela me auscultou e disse, “nossa”...
– Uau...
– Pois é...
– Pesado...
– Cruel.
– E... mais nada?
– Nada. Sabe, cismei. Nada! Absolutamente nada. Não disse nada. Não perguntou nada. Nem se eu estava expectorando. Cuspindo sangue. A cor do catarro. Da coriza. Esses detalhes escatológicos que eles adoram.
– Ela deve saber.
– ?
– Pelo “nossa”. Ela deve ter sacado tudo isso na hora do “nossa”.
– ?
– Ué, não tem japoneses, chineses, taichi paimei banzai kungfu panda, essas coisas, que fazem diagnóstico segurando o pulso do sujeito? Já vi isso, existe. Pois é isso. Ela te escuta, digo, te ausculta, e sabe se você ta encatarrado, a cor do seu catarro, temperatura, pressão, viscosidade, tudo. Normal...
– ...

– E... que cor?
– ?
– Que cor que tá?
– Em cima ou embaixo?
– Hein?
– Em cima ou embaixo?
– Porra, Weber... ce ta cagando catarro?
– ... Quando assôo o nariz ou quando eu tusso? Em cima, nas fossas nasais, ou embaixo, nos pulmões?
– Ah... Os dois.
– Verde em cima. Amarelo nos pulmões.
– Cruzes.
– Pois é... me deixou preocupado. Vi na Internet. Quatro tipos de coriza e catarro. Transparente, branco, verde, amarelo. Transparente ou branco é virose, não tem o que fazer, esperar. Mas o amarelo e o verde é infecção bacteriana.
– E o azul?
– ?
– O azul.
– Que azul?
– O azul, o azul.
– Que azul? Verde amarelo azul e branco? Agora catarro tem que sair na cor da bandeira? Catarro nacionalista?
– Azul, ué. Da onde vem o verde? Tem o amarelo, cor básica. O verde não é cor básica. É mistura de amarelo, básico, e azul, básico. Amarelo e azul. E o azul?
– Sei lá da onde vem o azul do catarro verde. Devo ter brincado com uma caneta bic quando era pequeno, enfiei no nariz, vazou pra dentro. Agora a tinta misturou com o catarro amarelo, ficou verde. Satisfeito?
– Ta, ta. Só queria...
– O que eu ia dizer... atenção... o que eu ia dizer: ela não me passou antibiótico... só água.
– ?
– Água. Muita água. Cinco litros de água por dia.
– Cinco litros?
– Cinco litros. Por cinco dias.
– Cinco dias?
– Cinco dias.
– Cinco por cinco? O que ela é, numerologista? Isso é mandinga, macumba. Ou pior, ela quer é te afogar. Ou afogar as bactérias. Quem souber nadar vai sobreviver. Você ou elas.
– E nada de antibiótico...
– Ei... É isso.
– ?
– É isso. O azul. Aí, vai por mim. Bebe água não.
– ?
– Cianofíceas.
– O quê?
– Cianofíceas. Algas azuis. É um tipo de bactéria. Azul. Você deve estar com uma infecção de cianofíceas também. Daí o verde. Amarelo e azul: verde. Agora, presta atenção. Cianofíceas não se afogam. Elas vivem na água. Não vão morrer, não importa o quanto você beba de água. Cinco, dez, vinte litros. As amarelas podem até morrer. As cianofíceas não.
– ...
– ...

– ...
– ...
– Acho que vou numa farmácia, ver se o cara me sugere um antibiótico.
– Se você começar a expectorar o...o... azul...
– Se isso acontecer, eu te aviso.
– Avisa.
– Eu aviso o Faustão...
– ?
– Esquece.
– ...

– ...
– ...
– Tem bactéria azul mesmo? Tem isso?
– Bactérias azuis. Perigosas...
– Perigosas?
– Perigosíssimas... Tóxicas.
– Cianobitas é...
– Hein?
– O nome dessas bactérias. Você disse. Cianobitas.
– Cianofíceas.
– O que eu disse. Isso aí.
– Disse cenobitas.
– Disse?
– Disse... e... ce sabe o que são né, os cenobitas...
– Sei.
– Bom filme.
– Bom. Hellraiser. Bom.
– Muito bom.
– Bom.
– Tinha algum azul?
– ?
– Cianobita?
– ?
– Azul. Que nem a alga. De repente tinha um azul. Pra justificar o nome, parecido com o da sua alga...
– Não é ciano. É ceno. Cenobitas...
– Ceno, ciano...
– Não, ceno é ceno, ciano é ciano.
– E o que é ceno?
– ... Deve vir de koinos... koiné... comum, básico. Essas coisas. Grego.
– Grego?
– Clássico. Grego clássico.
– ?
– History Channel...
– Ah...
– E, vem cá, e ciano... é o que afinal?
– Azul, cara, azul.
– Claro claro... tipo oceano? O azul. O ciano. O azul. O azul do mar... imensidão azul... essas coisas... que é?
– ...
– Esquece... você que veio com a estória do azul.
– Cor básica. Tava faltando pra explicar seu ectoplasma aí.
– Aí, não se diz cor básica.
– Não?
– Não. Diz primária. Cor primária.
– Sei... Primary Colors. Tipo o filme do Clinton fingindo que é o Travolta.
– O contrário.
– Esse também, esse também... Travolta. Tem que rezar todos os dias e agradecer a São Tarantino...
– O Tarantino é bom...
– Bom...
– Ce viu o curta?
– Dele?
– Do seu Tomelo. E do seu Jorge. Falando do Tarantino.

– Vi. Parece isso né.
– O que.
– O Curta. A gente, aqui, falando besteira. Que nem eles. Num café. Que nem nos filmes do Tarantino.
– Ou do Jarmusch.

– Isso...
– ...
– ...
– Se bem que os diálogos deles são melhores...
– São não...
– São não?
– Nada...
– Pode ser...
– Tudo a mesma bosta...
–...
– ...
– Aí, vou nessa. Quanto...?
– Deixa que eu pago. Ce ta doente.
– Beleza.
– Melhoras.
– Valeu.
– E... não esquece...
– ?
– Se ficar... a cor...
– Ah...meus cenobitas...
– Isso... Me liga.
– Tá.

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terça-feira, fevereiro 12, 2008

todos os eus e mais alguns - parte XII

– Respire fundo.
– Shhhh.....rumpf...coff... runfgrh... coff coff...
Ela tira o estetoscópio das minhas costas. Deve ter me olhado sem paciência. Não sei, estou de costas. Diz:
– Sem tossir, por favor.
Não paro de tossir. Por isso perder o almoço e esperar para ser encaixado. Eu vou encaixar o senhor, cochichou a atendente, preocupada. Só fiz tossir forte dez minutos. Ininterruptos. Encaixado em dois tempos. No meu caso, não preciso forçar a tosse. Ela vem. Forte. Por isso a consulta. Tosse. Tusso. Dez minutos. Pronto. Encaixado.
O primeiro exame que ela faz, auscultar, desde que sem tossir, por favor. Eu tento explicar. Ela: sem tossir, por favor.
Tento.
– Hummfffff.... rurgh...cofff... ahnnn... roarhg... coff coff...
Ela tira o estetoscópio das minhas costas. De novo. Deve ter balançado negativamente a cabeça. Feito uma cara de desgosto. Enfado. Derrota. Estou de costas. Não digo nada. Tento de novo. Digo antes “agora vai”, tentando animá-la, espero ela se posicionar e respiro, segurando a tosse com toda força e concentração do mundo.
– Nossa...
Ela diz nossa. Clínica geral. A cada dez casos que atende, nove devem ser de gripe. Ou tosse. Como a minha. E ela diz pra mim: nossa. Ela me ausculta, a mim, e diz: nossa. Ela não deve dizer nossa pra todo mundo. Ou diz. Sim, deve dizer. Pra todos. Será mineira ela? Claro. Mineiros dizem muito nossa. Nossa isso, nossa aquilo, dizem à toa, sem motivo nenhum, nossa, trem besta. Nossa. Nóss. Nu. Não. Ela é carioca. Cariocas raramente dizem nossa. E quando dizem nossa é pra não dizer “caralho fudeu mermão!”. Uma médica não pode dizer caralho fudeu, diz nossa, pra não assustar.
Pneumonia dupla, tuberculose, um desses hantavírus, retrovírus, pantovírus. Uma hepatite pulmonar, raríssima, meu senhor. Um vazamento de bílis nos bronquíolos. O senhor não tem pulmão, nenhum dos dois, respira por guelras. E elas estão com câncer. Há um navio cargueiro liliputiano dentro dos seus pulmões, meu senhor, e uma maria fumaça e uma escola de samba, e a bateria da escola está atravessada, causando arritmia cardíaca letal. Três dias de vida? Dois. Talvez horas.
Ela vai à mesa e senta. Espera que eu me recomponha e sente a sua frente. Demoro. Sei que demoro. Nem me dou. Rápido?, qual, tudo acabado. Tudo acabado, sem pressa. Demorar nos botões, nos cadarços. Pensar sobre eles. Velhos esses sapatos, rá, esses sapatos!, passamos muito juntos, e um sorriso melancólico. Um nossa e pronto, agora é olhar pela janela e me emocionar com um bem-te-vi na árvore, uma mosquinha zunindo, o vento. Com o cotonete jogado na lixeira do consultório. Nunca mais o meu. Nunca mais. Não, não penso nada disso. Ela não deixa.
– O senhor beba água. Muita água. Volte aqui em cinco dias.
Demoro a entender. Cinco dias... cinco? Não eram dois? Horas? Cotonete, sapato, melancolia... cinco dias. Água. E eu, a boca aberta, palerma. Respirei? Não, senão tinha tossido. Respiro agora? E a água?
Enfim respiro, tusso e balbucio.
– Mas... quanto...?
Ela pensa, nem isso, e num átimo de segundo.
– Cinco litros. Por dia. Água. Cinco dias. E o senhor volta aqui.
(continua? continuo?)

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